sábado, 23 de julho de 2016

O amor....

Você olha para o lado e no muro mais uma frase romântica pichada. Sorri feliz e até tira uma foto, o amor está lá, pintado no e emocionando quem passar por ali e ler. O amor está escrito no papel da bala, com frases curtas e incríveis e parece o suficiente. No adesivo do carro com corações vermelhos. E agora, ele também está lá, publicado no seu mural todos os dias. O amor está sendo divulgado em frases mal elaboradas a espera de mais uma opção curtir, de mais um seguidor. Em tempos onde todos viraram poetas e discípulos do romantismo, o amor se perdeu de vez num emaranhado de palavras que, juntas dizem menos do que separadas. E ‘eu te amo’ é frase que se compra e se vende mais barato do que pastel de feira. Antes o amor era cafona, agora o amor é plágio. Vem cá, onde ele foi parar mesmo? Do luxo ao lixo. Saiu dos corações, dos beijos molhados, das surpresas e das mãos dadas para virar politicagem barata em redes sociais. O amor está em promoção: “curta um e leve dois”. A nova aliança é ‘me segue que eu te sigo’ de volta. O romance escorre nas palavras enquanto o computador está ligado, depois são lágrimas que escorrem no travesseiro sem ninguém perceber. E no dia seguinte, uma frase de Vinícius de Moraes publicada só para dizer ao mundo que você ama e é feliz. Quando na realidade não sente um beijo de verdade faz um bom tempo. Tão acostumados a escrever, nós deixamos de dizer. E quanto menos se diz sobre o amor, menos se sabe sobre ele, menos se vive e muito menos se sente ou faz com que o outro sinta. Amar não é só escrever que ama. E se quiser digitar uma poesia, faça isso com seus dedos em minhas costas, por favor! Pior do que se ajoelhar virtualmente e declarar o amor para milhares de amigos que você sequer cruzou nos corredores do colegial ler, é aceitar aquelas declarações emolduradas por uma tela de computador, com palavras previamente ensaiadas, com pedaços de músicas se encaixando perfeitamente, vírgulas nos lugares exatos, reticências poéticas e uma concordância escandalosamente perfeita num exagero beirando o precipício. O amor escrito minuciosamente. Ali, perfeito e entregue de bandeja. E você aceita essa bandeja sem questionar e sem lamentar que não pode segurar ela com as mãos. Pior é acreditar em parágrafos que circulam em Ctrl C + Ctrl V e se sentir especial. Se o amor fosse uma pessoa, com toda certeza iria encher a nossa cara de porradas e cobrar ‘que porra é essa que vocês estão fazendo comigo?’. O amor virando palhaço de circo e a gente aplaudindo. O amor na vitrine e a gente se contentando em só olhar. O amor que antes era uma linda e natural flor, com cheiro e textura, agora virando flor animada em GIF, coberta de glitter. Me diz, cadê o toque? Onde estão os ‘eu te amo’ sussurrados ao pé do ouvido? As declarações mal feitas, acompanhadas de olhares apaixonados com medo de falhar? Onde estão os arrepios e o perfume? Estão todos engavetados e esquecidos e a culpa é toda nossa, simplesmente porque nós não cobramos o amor na carne. Não exigimos o amor ao vivo, no último volume. Temos medo de encarar o real tamanho do sentimento, e então usamos escudos disfarçados de telas frias e filtros do Instagram. Se for por culpa da distância, tudo bem e a gente aceita declarações que ajudem a manter a lembrança de que o outro existe e ama. Mas faça isso com competência. Muitos querem uma grande estória de amor, mas poucos são competentes para isso. Se for virtual, prefira então as promessas. E principalmente, aquelas que se cumpram depois lá fora, no mundo real, onde a gente se olha nos olhos enquanto faz amor. Onde compartilhamos a saliva e o suor – e não apenas frases. O amor não pode ser descartável. O amor não pode ser assim, fácil de deletar. Bastando um backspace e o amor acaba. Bastando um ‘desfazer amizade’ e o amor some. Bastando uma tinta no muro e o romantismo sendo abduzido sem que ninguém note. Não! Queira do amor tudo o que ele pode oferecer. A voz, a pele, o gosto, o olhar e a dor. Viva e morra por amores profundos e reais. Sofrer por publicações é humilhante. Morrer de amor apenas por frases é decadente. Faça-me versos sim, me cante com poesias de Leminski e Drummond de Andrade. Eu não quero que as palavras morram. Mas, ao final delas, não me mande ‘beijos’ virtuais, desligue isso aí e venha até aqui me beijar.
— Camile Heloíze.

quarta-feira, 6 de julho de 2016

Homem não gosta de mulher que insiste com recados consecutivos, mas também não gosta de mulher que não telefona. Mulher não gosta de homem que a persegue, mas também não gosta de homem que não a procura. Homem não gosta de mulher fácil, mas também não gosta de mulher difícil. Mulher não gosta de homem doce, mas também não gosta de homem rude. Homem não gosta de mulher que fica com muitos, mas também não gosta de encalhada. Mulher não gosta de mulherengo, mas também não gosta de travado. Homem não gosta de ser questionado, mas também não gosta de ser esquecido. Mulher não gosta de ser contrariada, mas também não gosta de gente passiva. Homem não gosta de estardalhaço, mas não adia uma bagunça. Mulher gosta de estardalhaço, desde que não vire bagunça. Homem não gosta de ser debochado, mas também não suporta ser levado sempre a sério. Mulher não gosta de brincadeiras sem graça, mas não admite a ausência de brincadeiras. Homem não gosta de fofoca, mas é o primeiro a contar as novidades aos amigos. Mulher gosta de fofoca, mas deseja preservar sua privacidade. Homem não gosta de jantar na casa da sogra, mas também precisa dela. Mulher não gosta de ser comparada com as antigas namoradas, mas também quer saber todos os detalhes. Homem não gosta de ser surpreendido, mas também não gosta de saber antes. Mulher adora um mistério, mas com aviso prévio. Homem não gosta de comprar lingerie, mas também é o primeiro a criticar a que ela está usando. Mulher ama comprar lingerie, mas também é a primeira a dizer que a incomoda. Mulher prefere calcinha bege, não aparece com a roupa. Homem abomina calcinha bege, aparece demais quando ela tira a roupa. Homem não gosta de discutir relacionamento, mas também não gosta do silêncio. Mulher gosta de discutir relacionamento, mas odeia chorar no meio da briga. Homem não tolera filmes românticos, mas não desliga quando reprisados na tevê. Mulher não aguenta filmes de ação, mas também é um alívio não pensar muito. Homem tem dificuldades para se declarar, mas faz o impossível para ser denunciado. Mulher espera declarações, mas não quando está se arrumando. Homem reclama dos atrasos, mas também detesta quem chega antes. Mulher odeia a impaciência do homem, mas também se enerva com a letargia. Homem não resiste a um videogame, mas também não deseja ser chamado de criança. Mulher abusa dos diminutivos, mas também diz que cresceu. Homem pede desculpa quando machuca, mas não aceita desculpa quando machucado. Mulher se desculpa antes de errar, depois não se lembra. Mulher desvia o assunto quando se desinteressa, mas não gosta que não prestem atenção nela. Homem não gosta de ser interrompido, mas vive interrompendo. Mulher admira poesia, mas não no sexo. Homem procura agradar a mulher ao recitar poesia no sexo. Homem não gosta de unhas vermelhas, mas fica excitado com elas num filme pornô. Mulher gosta de unhas vermelhas porque detesta filme pornô. Mulher anseia pelas flores, mas nunca tem um vaso para colocá-las. Homem gosta de mandar flores, mas desiste na hora de escrever o cartão. E ambos não gostam do meio-termo.
— Fabrício Carpinejar.